Baldios das Costas: a terra ancentral do povo que nem o 25 de abril conseguiu devolver

 


Já passaram 49 anos desde que, a 10 de setembro de 1974, poucos meses depois da revolução de abril, o povo da Comenda esteve à porta do Parlamento Português  [VER VÍDEO] a reclamar a devolução dos baldios das Costas. A manifestação foi expressiva mas foi apenas mais uma diligência debalde junto do poder central que em 1938 roubou ao povo da Comenda e do Vale da Feiteira os baldios que o povo usava desde tempo medievais, cultivando as terras e ainda andando aí com o seu gado.


O mapa atual mostra grande parte desses mil hectares de baldios que 'corriam' de norte para sul até encontrar o Sor.

Já aqui abordamos o assunto mas a ele voltamos a propósito de algo que lemos numa publicação do nosso amigo Carlos Aguiar, professor doutor do Instituto Politécnico de Bragança. Na sua publicação, é abordado um trabalho sobre os baldios de Pitões das Júnias, terra do extremo norte de Portugal, em pleno Barroso.  Aguiar cita um trabalho de F. Gusmão datado de 1964, no qual este refere que o baldio ocupava 5/6 do termino da aldeia e que garantia grande parte do seu sustento, sendo também aí que se conseguia a totalidade dos matos e quase todas as lenhas.

Conforme conta Jorge Branco no imprescindível 'Comenda com Alma' (2015). no início do século XX a população da freguesia de Comenda "era usufruária de uma extensão de terrenos agrícolas superior a 1500 hectares., uma pequena parte à volt do Vale da Feiteira e o restante nos chamados baldios das Costas, confinando o baldio mais pequeno com as propriedades de Vale da Rabaça, Braçal e Casaria, e o segundo situando-se entre as Polvorosas, o Braçal e a ribeira de Sor.

As terras eram distribuídas anualmente, de janeiro a setembro, entre o povo. Mas nos dias 1, 2 e 3 de janeiro a GNR entrou à força nos baldios e feriu e prendeu, alagadamente a pedido da Casa Inglesa Henry Bucknall, proprietária das Polvorosas.


Mas o povo da Comenda nunca se conformou e, em 1957, Adelino Maria, Manuel Tomé, Luís Mota e mais 15 chefes de família intentaram uma ação judicial reclamando a devolução dos baldios. sem sucesso. Como contou, já em 1974, Manuel Tomé Chamiço [na imagem a ser entrevistado pela RTP], era quase impossível vencer quando até o presidente da Câmara de Gavião da altura, Lino Neto, possuía mais de 60 mil oliveiras em terrenos baldios do concelho que tornou seus.

Com a revolução de abril, a questão ganhou um novo impulso e logo em 14 de maio de 1974 o povo da Comenda saiu à rua reclamando o que era seu, enquanto uma comissão de nove naturais da terra, entre os quais Jorge Branco, recolhia documentos e consultava documentação. O dossier foi, por isso reaberto, e o povo da Comenda poucas semanas depois estava em S. Bento, onde foi recebido apenas pelo chefe de gabinete do primeiro-ministro da altura.

De então para cá, é o que se sabe. A questão dos baldios voltou a baldar-se no largo rio do esquecimento, ficando aqui a ressalva da nossa ignorância sobre o que lhes aconteceu durante o tempo da reforma agrária.