Três castelos (Belver, Amieira e Crato) dos Hospitalários à volta da Comenda

 


O nome Comenda resultou certamente uma comenda do Priorado do Crato nascido na Ordem do Hospital (ou dos Hospitalários), cujos domínios se estenderam, em faixa, entre a Sertão e o limite sul de Alter do Chão, onde o Rio Raia (a atual Ribeira Grande), que terá dado nome ao topónimo de Fronteira, separava os territórios desta ordem e da Ordem de Avis (a primordial milícia de Évora).


Em 1194, os cavaleiros de S. João, que tiveram os seus primeiros castelos em território hoje da Síria e de Israel depois de terem conhecido uma fundação dedicada à assistência aos peregrinos europeus que demandavam a cidade de Jerusalém, foram contemplados com as terras de Guidimtesta, com a obrigação do rei Sancho I de construíram aí o castelo de Belver [imagem acima e abaixo].


João Gouveia Monteiro diz que este castelo já estaria construído em 1210, sendo considerado a mais importante fortificação do reino (por isso mesmo guardou parte do tesouro real).

De facto, quem o aprecia desde a margem esquerda do Tejo percebe bem a potência da sua defesa natural, a que acrescem os altos panos das muralhas. Ainda hoje, atingir a porta através da escadaria em pedra é, sobretudo no verão (e era nesta estação e na primavera que se guerreava naquela época), um desafio.

Gouveia Monteiro faz notar que este castelo estava numa primeira linha que recebia o impacto do novo impulso do avanço muçulmano através dos Almóadas, ramo berbere especialmente fanático e duro de roer. Mas o castelo também servia de tampão ao domínio em expansão dos Templários, partindo-o a meio através das terras da Ordem do Hospital, sobretudo a norte do Tejo.

O domínio hospitalário estendeu-se para Sul do Tejo e, segundo Paula Pinto da Costa, a partir de março de 1232, por doação régia, os freires de S. João passam a ser donos do Crato, onde também constroem um castelo e um pouco mais tarde amuralham a vila (atente-se neste corte da  cerca que evidencia bem o seu aparelho de construção, sendo uma aula de engenharia e arquitetura militar medievais).

O Largo do Castelo, no Crato

Quem se aproxima do Crato de várias direções percebe rapidamente, no ponto topográfico mais alto da vila, os pináculos em jeito de capelas imperfeitas da Batalha mas estas são estruturas que nada têm a ver com o castelo original. Aqui casou o rei D. Manuel I, o Venturoso, com Leonor de Castela. Um castelo de que pouco sobrou (como adiante se verá) e que deu lugar a um forte adaptado ao tiro pirobalístico, isto é, à artilharia, quando foi necessário abrir posições de tiro em muros defensivos agora ligeiramente rampeados e preparados para resistir melhor ao impacto balístico.

Eis os famosos pelouros lançados pelos primeiros canhões e numa fase anterior por máquinas de arremesso (balistas, trabucos, etc), colocados à entrada do castelo que agora se segue, o da Amieira [imagem de capa desta publicação], também ele um castelo hospitalário, acabado de construir em 1356, sob os auspícios Álvaro Gonçalves Pereira, pai de Nuno Álvares Pereira e de mais 31 filhos. Num momento em que a Ordem do Hospital já desviara o seu centro axial de Belver para o Crato, depois de ter iniciado a sua história em Leça do Balio (atual concelho de Matosinhos).

Castelo da Amieira

Por volta da quarta década de Quatrocentos, ainda antes da célebre Batalha de Aljubarrota, Álvaro Gonçalves Pereira concretizou uma série de obras nesta região que consolidaram no termo do Crato o poder hospitalário.


Para além do castelo da Amieira - que foi sobretudo paço do líder do clã Pereira -, do pequeno templo de Santa Maria então edificado iria nascer o paço-fortaleza da Flor da Rosa (da Rosa por associação a Rodes, uma das sedes da ordem e onde Álvaro Gonçalves Pereira esteve). A partir desse momento, Álvaro Gonçalves Pereira vê-lhe atribuído, pelo Grão-Mestre da ordem, o Priorado do Crato, ele que se fez sepultar precisamente na Flor da Rosa. Curiosamente, Nuno Gonçalves Pereira provavelmente não nasceu no termo do Crato mas sim no Paço de Cernache do Bonjardim, na Sertã, no extremo norte do domínio hospitalário, ele que viria a ser um triplo conde com um património quase comparável ao património real.


Paula Pinto da Costa sublinha as diferenças entre os três castelos que aqui trazemos. Segundo esta historiadora, o castelo de Belver é um castelo românico com a respetiva torre de menagem em posição central enquanto o castelo da Amieira, contruído quase um século e meio depois, insere-se dentro do plano construtivo definido por gótico, já com a respetiva planta retangular, torre de menagem adossada à muralha e torres também 'coladas' aos panos defensivos. Quanto ao castelo do Crato, é difícil consolidar um estilo inicial pois foi parcialmente destruído por um violento terramoto em 1531 e arrasado em 1662 durante a Guerra da Restauração, sendo posteriormente transformado num fortim abaluartado, sendo a tal massa construída que se destaca quando nos aproximamos do Crato.